Reforma Tributária: mudanças do regime de tributação das SAFs
A Lei 14.193/2021, instituidora da Sociedade Anônima do Futebol (SAF), é paradigmática no ordenamento jurídico brasileiro por viabilizar o modelo empresarial do mercado de futebol no Brasil, englobando aos clubes práticas empresariais, as quais têm o potencial de trazer diversos benefícios à atividade econômica futebolística.
Como forma de possibilitar a consecução desse modelo empresarial, a mesma lei instituiu o Regime de Tributação Específica do Futebol (TEF), o qual simplificou o recolhimento de tributos federais sobre a atividade exercida pelas SAFs, trazendo mais transparência e eficiência à tributação, reduzindo, assim, o custo de conformidade tributária.
O TEF é um regime simplificado de tributação, que consiste no recolhimento mensal dos tributos federais IRPJ, CSLL, PIS, COFINS e contribuições previdenciárias, mediante documento único de arrecadação. O recolhimento de tais tributos, mediante o pagamento mensal e simplificado substitui o dever da SAF de recolher tais tributos de maneira ordinária, como qualquer pessoa jurídica, com base no regime de tributação escolhido.
Em relação aos aspectos objetivos da obrigação tributária, a Lei 14.193/2021 fixou a alíquota e a base de cálculo do TEF por meio de critério temporal. Nos 5 (cinco) primeiros anos de constituição da SAF, a base tributável corresponderá às receitas mensais recebidas, sobre a qual incidirá a alíquota de 5% (cinco por cento), excetuando-se as receitas oriundas de cessão dos direitos desportivos dos atletas. Após o período de 5 (cinco) anos, há a redução da alíquota para 4% (quatro por cento), ao passo que é alargada a base tributável, sendo incluídas, além das receitas mensais ordinárias, aquelas oriundas da cessão dos direitos desportivos dos atletas.
No atual regime tributário das SAFs, estão excluídos os demais tributos onde a entidade possa eventualmente ser contribuinte caso realize os respectivos fatos geradores, como o ISS e ITBI, de competência municipal e do Distrito Federal; ICMS e ITCMD, de competência estadual e do Distrito Federal; e o IPI e IOF de competência federal.
A Reforma Tributária instituída pela Emenda Constitucional 132/2023 provocou profunda modificação no Sistema Tributário Nacional e afetará as SAFs. Em resumo, a principal ambição da Reforma Tributária é simplificar a tributação do consumo, mediante um modelo não cumulativo de tributação, substituindo o PIS e a COFINS pela Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), de competência federal, e o ICMS e ISS pelo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), de competência compartilhada entre os Municípios, Estados e Distrito Federal.
A proposta de regulamentação da Reforma Tributária está em tramitação no Congresso Nacional e foi consolidada pelo Projeto de Lei Complementar (PLP) 68/2024. O PLP 68/2024 trouxe mudanças significativas ao TEF. Se aprovado na forma da proposta submetida ao Poder Legislativo federal, o TEF será composto pelo recolhimento unificado do IRPJ, CSLL, CBS e IBS, além de contribuições previdenciárias (art. 282, §1º, da PLP 68/2024).
Além disso, haverá mudanças na base de cálculo e na alíquota dos tributos que compõem o Regime de Tributação Específica das SAFs. O PLP 68/2024 deixa claro que a base de cálculo da tributação unificada serão todas as receitas recebidas no mês pela SAF, incluindo nominalmente aquelas oriundas de prêmios e programas de sócio torcedor, cessão dos direitos desportivos dos atletas, cessão de direitos de imagem e de transferência do atleta para outra entidade desportiva ou seu retorno à atividade em outra entidade desportiva (art. 282, §3º).
A alíquota global proposta pelo PLP 68/2024 será de 8,5% (oito inteiros e cinco décimos por cento), segregada da seguinte forma: 4% (quatro por cento) referente ao IRPJ, CSLL e contribuições previdenciárias; 1,5% (um inteiro e cinco décimos por cento) referente à CBS; e 3% (três por cento) para o IBS, sendo este dividido pela metade entre Estado e Município (art. 282, §4º).
Entretanto, o próprio PLP 68/2024 prevê novos critérios temporais para fixação da alíquota, substituindo o atual critério previsto pela Lei 14.193/2021, definindo um período de transição, o qual acompanhará a consolidação definitiva dos efeitos da Reforma Tributária já prevista pela EC 132/2023.
Segundo o projeto, a alíquota da CBS será reduzida em 0,1% (um décimo por cento) para os anos-calendário de 2027 e 2028 (art. 283, II). Já o IBS passará por um longo período de transição, de 2027 a 2032, nos termos do art. 283, III, do PLP 68/2024, sendo que a alíquota final de 1,5% (um e meio por cento) para as SAFs somente valerá a partir do ano-calendário de 2033:
Art. 283. De 1º de janeiro de 2027 a 31 de dezembro de 2032, as alíquotas dos tributos que compõem o TEF serão:
III – quanto ao IBS:
Durante o período de transição, as receitas tributárias do IBS serão normalmente repartidas entre os Estados e os Municípios.
O recolhimento do IRPJ, CSLL e de contribuições previdenciárias, por sua vez, não será submetido a critérios temporais, mantida a alíquota de 4% (quatro por cento) após a aprovação da regulamentação da reforma.
O PLP 68/2024, por fim, veicula outros aspectos relevantes em relação à tributação das SAFs inauguradas pela regulamentação da Reforma Tributária:
A manutenção do TEF, sem dúvida, é uma vitória para as SAFs, já que o regime de tributação simplificado foi conservado no pós-reforma, ainda que com alterações. No entanto, com a consolidação definitiva da reforma tributária, prevista para ocorrer somente em 2033, haverá inegável aumento da carga tributária em comparação com o regime atualmente vigente. De qualquer sorte, comparada a outros setores da economia nacional, as SAFs ainda terão vantagem tributária considerável, o que permitirá a plena consecução da atividade empresarial futebolística no Brasil.